PERGUNTA: Não achais algo censurável, ou mesmo deprimente, o comportamento sexual do homem terreno?
RAMATÍS: Seria absurdo o homem tentar programas de angelitude, sem antes passar pelos estágios libertadores e sentir a inconveniência de não ser santo. Jesus, o Mestre Amado, fez a sua trajetória santificante através de todas as experiências deprimentes, para a consagração superior, demonstrando que a alma alcança mais sensatamente a sublimação divina pela saturação dos desejos mundanos do que, propriamente, pela fuga.
Nada há de humilhação na conduta do troglodita nas suas atividades semi-humanas de comportamento animal, inconsciente da realidade espiritual; mas, sob o prisma da razão desenvolvida, deve-se apontar o inconveniente e censurar, quando a criatura pratica atos "inferiores", e já possui conhecimentos superiores.
A própria natureza ampara desde a cicuta letal ao guaraná revigorante, do verme asqueroso no lodo da terra ao colibri matizado voando sobre as flores, e tem cuidados e carinhos pela hiena caçadora de instinto predador e pela ovelha inofensiva. Diante desse raciocínio, seria absurdo exigir do terrícola, criatura primária, mal soletrando o ABC espiritual, um comportamento sexual rígido e dentro dos padrões avançados da espiritualidade, quando ainda é dominado pela força poderosa, criadora, da natureza em suas manifestações. A maior porcentagem dos habitantes da Terra ainda não passa de velhos trogloditas, selvagens hotentotes, ensaiando, pelas sucessivas encarnações, o comportamento ao nível humano. Daí, o motivo das guerras, conflitos, ciúmes, vinganças, luxúrias, glutonices, agressividades, avarezas e as tolas vaidades de ter objetos, enfeites e penduricalhos, representando o atavismo dos primitivos adornos de cacos de pedras, ossos nos lábios e orelhas dos botocudos.
PERGUNTA: Mas, por que todas as religiões, e mesmo doutrinas espiritualistas, anatematizam o comportamento sexual da humanidade, estigmatizando a criatura terrena como pecadora a caminho do Inferno? Seria a Terra, mais propriamente, um mundo ignóbil e onde vive uma humanidade condenada?
RAMATÍS: Sob o manto religioso, ocultam-se homens iguais ou piores do que aqueles que são estigmatizados nos púlpitos, nas tribunas e nas sessões doutrinárias. Em verdade, o homem ainda crê ser Deus o criador do Universo, porém, verificou tantos erros na Sua pressa criativa que resolveu corrigi-los mais rapidamente possível, assim como o autor de uma obra literária ou científica, ao verificar a série de equívocos tipográficos ou de linguagem, ainda em tempo, afixa uma "errata" após o epílogo da obra.
Daí, o motivo dos esforços heróicos de muitos religiosos, espiritualistas filantropos, a se esgotarem na faina caritativa de corrigir os erros de Deus. Mesmo os reencarnacionistas, entendidos na mecânica da evolução espiritual pelos renascimentos físicos, querem desfazer os equívocos pelas empreitadas de "salvação" dos infelizes que nascem desprotegidos, deformados ou estigmatizados no mundo, porque isso não lhes parece a "colheita podre de ruins sementes lançadas alhures", mas alguma negligência divina.
Em face de a criatura pretender "ganhar o Céu" pela atuação competitiva e deliberada para melhorar a sociedade, vendo nisso a possibilidade de mais breve satisfação, passa a combater furiosamente os mesmos pecados nos quais se chafurdou, como o indivíduo temeroso de voltar a fumar, que vive fugindo do cheiro e da fumaça do cigarro.
Daí, os altiloqüentes pastores, sacerdotes e doutrinadores a esbravejar do alto de suas tribunas contra os pecadores que afrontam e ofendem a Deus, porque ainda praticam coisas tão naturais à sua condição espiritual, iguais às crianças que descarregam sua ira na agressão aos brinquedos. No entanto, no âmago, sentem não estar realmente livres dos impulsos instintivos, mas os "santos abafados" defendem-se dessas impulsões internas, apontando minuto a minuto o perigoso inimigo, a rondar suas almas primárias, e repletas de impulsos primitivos.
A Terra, sem dúvida, é uma severa, contudo, eficiente escola de educação espiritual, como qualquer educandário capaz de conduzir os seus alunos ao aprendizado. Os alunos que a freqüentam são espíritos encarnados, procurando uma conduta melhor e a sabedoria eterna, e mal soletram as primeiras letras do alfabeto divino. Para esses pregadores das suas verdades, vale o velho e justo ditado: "Diabo na velhice torna-se ermitão", uma vez que todos os anatematizadores dos pecadores, ou já pecaram até à saciedade, ou ainda são candidatos em potencial. Há pseudo-santos preocupados com a sua "salvação" do mar de lodo do vício, os quais fazem estatísticas de todas as atividades sórdidas no mundo, numa atração de sua intimidade psíquica à fuga para as cavernas de ermitões, porque condenam todos os prazeres do mundo como o carnaval, o futebol, os concursos de beleza, o turfe, a riqueza, a fartura, o divertimento, o jogo, o beijo, o divórcio, o homossexualismo e a prostituição, confundindo como pecados muitas vezes, a expressão de homens "ainda" pecadores, em busca de um momento de alegria, ou sejam, crianças espirituais.
Do livro: “Sob A Luz do Espiritismo” Ramatís/Hercílio Maes – Editora do Conhecimento.