quarta-feira, 24 de junho de 2015

Trabalho de um Exu



Estou num canto do terreiro observando os trabalhos. Os médiuns já estão em posição, velas foram firmadas, todos já bateram cabeça. Os pontos invadem o salão.
Na assistência pessoas que frequentam a casa com assiduidade e outras que pisam pela primeira vez. Sinto que algumas estão visivelmente emocionadas, seus protetores estão ali. Outras estão suando frio, passam mal, estão agoniadas, afoitas para saírem dali.
Espíritos trevosos estão atuando sobre elas, querem sair dali o mais breve possível, pois temem serem descobertos. Certamente serão afastados e não poderão perturbar aquelas pessoas.
A Mãe de Santo vibra com intensidade, na corrente um médium balança a cabeça, parece que vai cair. Percebo que seu caboclo está por perto. O médium ainda é novo, não está totalmente integrado com seu guia, mas com paciência e amor, em breve estará incorporando seu caboclo.
Na corrente, muitos estão incorporados.
O caboclo chefe, toma a Mãe de Santo, como faz há décadas e brados de guerra são ouvidos. Na medida em que os irmãos da mata chegam, trazem forte energia para todos. Unidos numa só força, eles, através dos passes, retiram da assistência os eguns e kiumbas, limpam as pessoas que estão perturbadas, e transmitem força e esperança.
As pessoas que antes choravam, agora sorriem aliviadas. Dores são aplacadas. Vejo que muitas daquelas pessoas em breve, estarão também recebendo os seus guias. Embora esteja acostumado a ver essas cenas, sempre me emociono. Daqui do meu canto, serenamente acompanho os trabalhos.
Repentinamente uma jovem da assistência, põe-se a vociferar. Sua voz antes melodiosa e serena, torna-se grave e arrogante. Ela tenta agredir os fiscais da casa, que habilmente a conduzem para dentro do terreiro. Sem dúvida o kiumba que a acompanha é muito perigoso. Os caboclos estão alertas, nem bem cruza a porteira, o kiumba grita, xinga, tenta machucar a pobre moça, diante da mãe desesperada que se encontra na assistência.
Os caboclos abrem a roda, os atabaques soam mais alto. O caboclo chefe se adianta sobre ele, forte energia circula sobre o corpo da jovem moça. O caboclo não quer que ela se machuque, ele vibra sua maraca e o caboclo da menina pela primeira vez aproxima-se da filha com força.
Chegou minha hora, me aproximo calmamente. O kiumba evita meu olhar, se desespera. Sorrio e caminho em sua direção, preparo minhas armas. Ele grita, esbraveja. O caboclo pede meu apoio. Não me faço de rogado, para desespero do kiumba, de um salto estou com minha espada em sua garganta. Domino-o com facilidade. Chamo outros que o amarram e o levam para seu devido lugar. Outros kiumbas menores que o acompanhavam, também são capturados e receberão seus castigos.
A moça acorda leve e feliz. Os caboclos terminam o descarrego, agradecem meu auxílio. Eu volto para o meu canto, ali na cafua observo o fim dos trabalhos. Minhas velas, meus charutos, meu marafo estão firmados. Os trabalhos terminam, todos se vão felizes.
E eu, na porteira, estou de sentinela...
Autor Desconhecido