Retirado do Livro Diário Mediúnico - Guia de estudos da Umbanda - Noberto Peixoto
Mediunidade combina com prosperidade financeira?
É certo que o exercício mediúnico deve se pautar pela seguinte máxima: “dar de graça o que de graça recebemos”.
O que me chama atenção é que seguidamente temos médiuns operosos, dedicados, assíduos, e suas vidas não têm prosperidade. Conversando aqui e ali, verifico que ainda temos marcado muito forte em nosso inconsciente que ganhar dinheiro é uma coisa ruim, que não combina com o sagrado, que vai nos atrapalhar. Verifico, ainda, um medo de “não se entrar no Céu”, decorrente da explicação de Jesus acerca da dificuldade de um rico alcançar esse feito, quando disse ser mais fácil um camelo passar no buraco da agulha do que isso acontecer.
A resposta de Jesus para o jovem rico que o perquiriu não se baseou só em sua riqueza, mas no fato de que seu coração estava cheio de avareza e idolatria pelas moedas. Não é possível que Deus seja contra a riqueza, a troca mercantil, o progresso.
O jovem rico, ao inquirir de Jesus sobre o que fazer para herdar a vida eterna, ouviu do Mestre que deveria desfazer-se de suas riquezas, para ter um tesouro no Céu. A questão não era o dinheiro que o jovem acumulava, e, sim, sua idolatria pelo material.
A explicação de Jesus, dizendo que é mais fácil um camelo passar por um buraco de agulha do que um rico entrar no Céu, incorretamente interpretada até os dias atuais, faz muitos pregarem contra os bens materiais e acreditarem na trilogia: espírito, Céu e pobreza. Com certeza, nosso coração e nossa
consciência não devem estar apenas nas riquezas pueris. Todavia, ganhar dinheiro honestamente, em abundância, não constitui maior empecilho que o mundo profano, os apelos carnais e o próprio orgulho, uma vez que ser pobre não é ser humilde e vice-versa.
No exemplo do jovem, diante de Jesus, recomendou-se, de forma figurada, que ele deveria deixar o apego às riquezas. Na verdade, a riqueza potencializará o que nossas emoções negativas exprimem em nosso modo de ser, como um meio de exacerbação involuntária da falta de autoconhecimento, como o são o apego à fama, ao talento reconhecido, à boa aparência, com roupas da moda, ou ao intelectualismo exagerado, à sexolatria e à vaidade desmedidas.
Infelizmente, a mentalidade dominante no meio judaicocristão – incluindo-se o espiritismo e também nossa Umbanda, pois seria impensável negarmos a influência católica em nossas comunidades – é a de “bem-aventurados os pobres”, quando deveríamos enfatizar: “O Senhor é meu pastor; nada me faltará”.
Um dia desses, escutei de um dirigente Umbandista que tem seu terreiro quase caindo aos pedaços, em um barracão de madeira, que não reformava o local para o povo não pensar que eles tinham dinheiro, mesmo o agrupamento sendo auto suficiente financeiramente e o terreno sendo deles. Pode?
Voltando à pergunta de que se mediunidade combina com prosperidade, respondo: é claro que sim. Temos, na Umbanda, a linha dos Ciganos, que nos trazem uma alegre mensagem de axé – força – para abundância, fartura e prosperidade em nossas vidas.
É preciso falar um pouco da origem dos Ciganos, para entender seu trabalho e por que ele é realizado na Umbanda.
Primeiramente, temos de desmistificar a imagem do andarilho cigano, malandro, ladrão, sequestrador de criancinhas, falastrão, desonesto. Isso foi fruto do preconceito diante dessa etnia
livre e alegre, principalmente pelo fato de a crença deles não ser católica, religião dominante, confundida com os estados monárquicos por muito tempo.
Os Ciganos chegaram ao Brasil oficialmente a partir de 1574. Existiam disposições régias proibindo-os de entrarem em Portugal. Em 15 de julho de 1686, Dom Pedro II, rei de Portugal, em conluio com o clero sacerdotal da Igreja, determinou que os Ciganos de Castela fossem exterminados e que seus
filhos e netos (Ciganos portugueses) tivessem domicílio certo ou fossem enviados para o Brasil, mais especificamente para o Maranhão.
Dom João V (1689-1750), rei de Portugal, decretou a expulsão das mulheres Ciganas para as terras do pau-brasil. Por anos a fio, promulgaram-se dezenas de leis, decretos, alvarás, exilando os Ciganos para os estados de Maranhão, Recife, Bahia e Rio de Janeiro, onde se encontravam os núcleos populacionais mais importantes da colônia portuguesa. Este mesmo rei, Dom João V, proibiu os Ciganos de falar o romani, uma de suas línguas.
Afirma-se que as mais importantes contribuições dos Ciganos para o progresso e a prosperidade de nosso país foram negligenciadas até hoje pelos historiadores e livros escolares. Eles foram coparticipantes da integração e da expansão territorial brasileira. Ouso afirmar, ainda, que, se não fossem os Ciganos, as comunidades de antigamente, pequenos centros habitacionais, vilarejos, teriam progredido muito mais lentamente.
Os portugueses e africanos que vieram para cá não eram nômades. Os lusitanos procuravam fixar-se em terras alémmar, e os africanos fixavam-se a estes últimos como escravos.
Então, de norte a sul, de leste a oeste, em todos os lugares, lá estavam os Ciganos, livres, viajando em suas carroças, negociando animais, arreios, consertando engenhos, alambiques, soldando tachos, levando notícias, medicamentos, emplastros e também dançando, festejando e participando de atividades circenses.
Alegres, prudentes, místicos, magos e excelentes negociantes, quando chegavam aos vilarejos conservadores, era comum senhoras se benzerem com os rosários em mãos, esconderem as crianças nos armários, pois chegavam os Ciganos com suas crenças pagãs.
Assim como os espíritos de negros e índios foram abrigados na Umbanda, por falta de espaço para suas manifestações nas lides espíritas, todas as raças encontraram no mediunismo Umbandista liberdade de expressão. Os fatores mais importantes que permanecem em um povo, desde a mais remota antiguidade, são de consistência espiritual, com manifestação nos sentimentos e no modo de ser mais íntimo, com comportamentos típicos, frutos da memória coletiva, ou seja, de uma herança atávica.
É inconcebível, como o fazem nas hostes kardecistas, doutrinar um espírito milenar em minutos, fazendo-o deixar de ser um brâmane, um filósofo grego, um mago persa, um aborígene, um negro africano, um índio ou um cigano, passando a ser “só um espírito”.
Com respeito a todas as formas raciais, a Umbanda foi plasmada no Astral para oportunizar a manifestação de todos esses espíritos comprometidos com suas histórias e consciências coletivas, que não se desfazem e refazem em minutos de oratória racionalista, em uma mesa espírita.
Não faz pouco tempo, estive envolvido no aluguel de uma sala comercial para instalar minha empresa de distribuição de catálogos por vendas diretas. Estava apreensivo com a inadimplência e temeroso de que esse novo passo, para o qual teria que assumir investimento e novas representações, não fosse bem-sucedido. Fiz uma prece fervorosa no congá da choupana, pedindo amparo e que, se fosse de meu merecimento, conseguisse intuição para tomar as decisões certas em relação ao novo empreendimento, dado o baixo capital de giro de que dispunha.
Sou da opinião de que quem não pede não leva e de que devemos saber pedir, para não ganharmos o que não queremos.
Podemos pedir um cavalo ligeiro e ganhar um burrico manco, tendo ainda que dar de comer ao bichano. Na dúvida sobre a equidade do que se pede, melhor calar.
Na mesma noite da prece no congá, no meio da madrugada, senti uma Cigana ao lado de minha cama; alta, com saia rodada vermelha, uma tiara prendendo os longos cabelos negros, cantava e dançava flamenco com castanholas, dizendo ser a Cigana formosa da Andaluzia, região da Espanha.
Em desdobramento, pegou minha mão fluídica, a esquerda, e comprimiu dois pontos, dizendo-me que estava ativando algumas linhas de força em meu chacra palmar, que me fortaleceriam, no sentido de ter maior tenacidade e não desistir facilmente do novo projeto.
Ao acordar, senti comichão forte em dois pontos da palma esquerda, que ficou quente e vermelha. Nesse momento, ouvi a Cigana formosa dizendo-me que estaria, a partir de então, junto comigo em meu estabelecimento comercial e de trabalho.
Atendia um pedido de caboclo Pery e fora, então, designada pelo senhor Tranca Rua das Almas, por ser o Exu guardião da choupana, zelador da corrente mediúnica, para que me acompanhasse, ajudando-me para que meus caminhos de prosperidade estivessem abertos e assim atraísse, pela lei de atração e afinidade, negócios em mesma faixa vibratória, de abundância e progresso.
Deu-me um recado, ao final dessa experiência:
Meu caro cigano Zartheu. É assim que te conheço de longa data: tua preocupação com a coletividade religiosa com que estás envolvido, esquecendo-te da tua própria bonança, muitas vezes sem uma moeda no bolso e mesmo assim não se abatendo diante de tantas rogativas e choro por falta de emprego, dinheiro e penúria dos consulentes. Este simples fato de não pensares em ti, quando vestes o branco da Umbanda para auxiliar os que te batem à porta do terreiro, deu-te merecimento para que fosse ajudado. Nada é um acaso. Em idos antigos, quando ocupávamos o mesmo clã e eu te era a amada, cuidava de todos os negócios de nossa família Cigana, que era enorme. Tu confiavas em mim cegamente, até o dia que te traí com um jovem cigano galanteador de outro clã. Não te lembras do ataque em tuas tendas em altas horas de madrugada, do assalto e assassinatos infames?
Caímos, eu e ele, na mais grossa traição, conspurcando nossa fé e etnia. Não sabes quanto sofri por isto; “expulsa” de nossa tribo por nossas leis, deixada a esmo no interior da Espanha católica, acabei me recolhendo em convento. Por não ter procedência aceita, terminei meus dias como serviçal das freiras, que, por qualquer motivo, escarneciam da minha origem étnica, chamando-me de bruxa megera, pelo fato de a arte da leitura das mãos ser uma heresia. Quanto sofrimento, meu querido, e agora tenho a oportunidade sagrada de me reequilibrar com as leis divinas, auxiliando-te como fiel e formosa olheira no Astral, contribuindo para que recebas novamente um pouco de tudo que te fiz perder. Meu amor pela história de nosso povo é enorme e compreendo que nada é definitivo. As oportunidades são eternas, diante da bondade infinita do Pai. Conta com tua amiga, agora mais fiel do que nunca, para que consigas um pouco na Terra, o suficiente para uma vida digna, com bonança, e te dediques cada vez mais ao espiritual.
Todos aqueles que de alguma forma dependem de ti neste corpo, desde a filha de Iemanjá, que está muito próxima, zelando por ti e amando-te como mulher, e teus familiares, médiuns, consulentes, público leitor, entre tantos, encontrem sempre a serenidade em teu semblante, que a abundância e a prosperidade oferecem, quando associados com a espiritualização do ser que a nossa amada Umbanda forja. Que Deus e os sagrados orixás nos abençoem. Tua eterna amiga, hoje Cigana formosa.
O vento vai trazer uma Cigana
Que as flores da campina vão vergar.
São uma, são duas, são três flores,
De onde seu perfume vai tirar.
Quando cheguei à aldeia
Senti um aroma de rosas.
Havia uma Cigana formosa,
Qual Cigana eu encontrei.
Levanta a saia, oh, Cigana!
Não deixa a saia arrastar,
A saia custa dinheiro,
Dinheiro custa ganhar.