Aconteceu em um Terreiro
Certa vez, em uma gira de preto velho entrou uma senhora fora de si.
Começou a falar que preto velho era burro que não sabia nem ler e escrever que falava errado e que não tinha capacidade para ajudar ninguém.
Neste dia a sessão estava sob o comando espiritual de pai Joaquim de Angola.
Alguns cambonos queriam colocar a mulher para fora do terreiro, porém pai Joaquim interviu e disse que não. Os cambonos assustados falaram, mas meu velho o que iremos fazer então.
Pai Joaquim disse: Tenham calma e traga ela até aqui.
A mulher chegou próximo ao preto velho e começou a gritar a xingar novamente. Com toda calma do mundo pai Joaquim pegou o cachimbo deu um sorriso de canto e ouviu tudo o que a mulher tinha a falar.
Assim que ela acabou Pai Joaquim então usou sua sabedoria: Acabou de falar minha filha ???
Sim. E não sou sua filha.
Então filha, repete ele novamente. Este nego o qual que você falou essas palavras de ódio, rancor, maldade, mentira, inveja nada tem a ver comigo nem com os pretos desse Terreiro.
A simbologia do preto velho é amor, humildade, perdão, sabedoria, paciência, carinho. Não preciso falar errado, aliás eu não falo errado estou falando corretamente com você na língua clara o português correto.
A fala de preto velho que muitos dizem ser errada é apenas o arquétipo da falange.
Filha fui negro, fui escravo, não sabia nem ler e escrever de fato, porém a minha escola foi a vida. Não tento o diploma do homem branco da terra, mas tenho o diploma da vida e ele é equivalente.
Minha escola foi a dor, o sofrimento, a perseguição, a intolerância, a maldade, porém sai dessa escola oferecendo amor, paz, perdão, paciência, calma, sabedoria e fé.
Cada um só pode oferecer aquilo que tem e este velho negro como diz você: escravo, analfabeto, burro só pode lhe oferecer amor, paz, perdão, sabedoria, paciência, resiliência.
Agora vou falar na lingua de nego: suncê tem o estudo da matéria, mas não tem o estudo da vida fiía. Então suncê vai precisa aprender esse estudo aqui no terreiro.
A mulher riu e disse a Pai Joaquim: jamais !!!
Então o velho sorriu bateu com a bengala no chão. Olhou pra curimba e cantou:
Lá vem vovó descendo a serra com sua sacola e com seu patuá e com sua bengala ela vem de Angola. Eu quero ver vovó Eu quero ver Eu quero ver se filha de Pemba tem querer.
Então a mulher que minutos atrás estava maltratando o arquétipo de preto velho começou a se tremer. Foi então que uma voz suave falou: Salve as forças de vós, Salve nosso senhor do Bonfim, Saravá minha Bahia.
Tudo quê essa fía tem preconceito e não sabe ela vai aprender com aqueles que ela rejeita. É hora desta nega chamada vovó Maria Conga ensinar essa fía a verdadeira escola da vida.
Aonde não é o diploma de papel que é válido e sim o o diploma da vida.
E cantando a vovó subiu:
Maria Conga nunca foi à cidade, Oi sinhá Fala na lingua de Zambi Oi sinhá... Eeee oi sinhá Fala na lingua de Zambi...oi sinhá.
Quando a gente não sabe se colocar no lugar do outro, a vida coloca a gente lá pra aprender na prática.
Pai Joaquim de Angola.
Arletty Santos