sábado, 14 de abril de 2018

O Enigma Exu Mirim

No decorrer dos milênios, todas ou quase todas as religiões organizadas tiveram nos gêmeos infantis um dos seus mistérios, e eles ocuparam e ainda ocupam um lugar de destaque em muitas delas.
Na África, em várias religiões, 
os gêmeos estão presentes ou, quando não aparecem juntos, pelo menos um se faz presente. Assim como ocorre entre os índios brasileiros, em que a criança é chamada de curumim e há seres sobrenaturais infantis ou mirins.
Se assim foi, é e será, então temos que identificar melhor 
esse mistério e descobrir algumas de suas funções na Criação, porque a partir daí ele fica fundamentado e o entendimento sobre ele torna-se acessível a todos os umbandistas que, quer queiram ou não, têm à esquerda uma entidade “infantil” cuja companhia não recomenda ao seu filhinho, pois preferem colocá-lo num jardim de infância frequentados só por criancinhas da “direita”.
Afinal, essas crianças da “esquerda” (os Exus e as Pombagiras Mirins) fumam, bebem, e ainda atazanam a vida de quem os ofende ou os desagrada, não é mesmo?

São crianças condenadas ao purgatório ou ao abandono nas “ruas”, largadas não se sabe por quem, pois nenhum Orixá assumiu a paternidade delas e nenhum os recolheu aos seus Domínios na Criação, preferindo enviá-los para os de Exus que, ao contrário dos outros Orixás, não nega abrigo em seus domínios a ninguém.
A todos Exu acolhe e com todos se relaciona amigavelmente. E assim foi na Umbanda, quando ninguém sabia o que fazem com os infantes da esquerda,Exu deu-lhes casa e comida, digo, domínio e campo de ação. 
Firmado no lado de fora dos templos de Umbanda, mas ganhando aqui e acolá um “ebozinho” minguado para resolver complicações indissolúveis, Exu Mirim foi sobrevivendo à mingua e entre a própria sorte... ou azar quem sabe? Isolado no gueto ou no cortiço dos meninos mal educados e desbocados, Exu Mirim raramente entra na “casa grande” (no templo) e, ainda assim, é para limpar e levar embora a sujeira alheia (dos consulentes). Afinal, só raramente o chamam para realizar um trabalho de ponta a ponta, ou seja, do começo ao fim! Mas, boa parte da má educação e do “desbocamento” dessasentidades infantes da esquerda deve-se ao comportamento dos seus médiuns e não ao Orixá Exu Mirim.
Afinal , que melhor momento há para fazer “artes” do que quando incorporado com seu Exu Mirim, não é mesmo?
Que melhor oportunidade há para falar palavrões do que quando incorporado por um espírito “desbocado e mal educado?” Há médiuns que chegam a enfiar os dedos nas narinas e comer ou fingirem que comem “ronhas”, chocando quem os vêem fazendo tal coisa. Há outros que fazem micagens (gestos de macacos) e mostram a língua para os assistentes, além de gestos obscenos
impublicáveis quando incorporados com seus Exus Mirins, fazendo uma pantomima nada religiosa.
Mas isso não é inerente aos Exus Mirins, e sim, à falta de informações dos seus médiuns, pois não se doutrinam nem aos espíritos que incorporam e os usam para extravasarem o que têm em seus íntimos.

Exu Mirim é superior a tudo isso e, mesmo sendo relegado à míngua na maioria dos centros e por um grande número de médiuns umbandistas, vem sobrevivendo com um dos mais fechados dos mistérios da Umbanda e vem resistindo a comentários mais absurdos possíveis já publicados por pessoas que não só o desconhecem como nada sabem sobre ele.


Texto extraído do livro “Orixá Exu Mirim” de Rubens Saraceni, Editora Madras.