A LIÇÃO DE UM EXU
Era o dia da grande festa. O salão lindamente decorado estava lotado.Num canto, com uma garrafa de pinga e um charuto na mão, um Exú chamava a atenção pela simplicidade de sua roupa e comedimento de seus atos.
Enquanto os Exús e Pomba Giras estavam ricamente vestidos, aquele Exu vestia uma roupa muito simples e uma capa que indicava anos de uso, já encardida pelo tempo.
Ribamar, Laurinda e Jovelina, não paravam de comentar, rir e caçoar daquele Exu, que não dançava, apenas observa a tudo e a todos, quieto no seu canto.
Lá pelas tantas, ribamar para fazer graça com as amigas, resolveu se aproximar do Exu e perguntou, rindo com ar de deboche:
- Eaí meu velho, seu filho esqueceu sua roupa em casa? Quer que eu peça uma roupa bonita para o senhor com o dono da casa?
- Não meu filho, eu estou bem assim. Eu sou um Exu simples e meu cavalo é pobre e com muita dificuldade conseguiu mandar fazer esta roupa pra mim. Muito obrigado por sua preocupação comigo.
- Mas, meu velho, se o senhor é um Exú de verdade, porque não ajuda seu filho a ganhar dinheiro e comprar uma roupa bem bonita para o senhor?
- Como lhe disse meu filho, eu estou bem assim, estou feliz com o que ganhei. Só eu sei o quanto foi difícil meu filho me dar esta roupa! Cada um dá o que pode e pra mim o que importa é a fé que ele tem e o amor que me dá. Do que adiantaria se ele me desse roupas caras e não me desse o seu amor?
Do que adiantaria se ele me desse roupas caras e me esquecesse dentro de um quarto, deixando o meu assentamento sujo e minha quartinha seca? De que adiantaria se ele me desse roupas caras só para ostentar em público aquilo que não é e mostras aquilo que não tem?
-Meu velho, o senhor fala muito bonito, mas pra mim um Exu de verdade tem que dar as coisas para seu filho, abrir seus caminhos e colocar dinheiro na mão dele. Exu gosta de riqueza, de um bom whisky, de um bom champanhe, de charuto importado e de uma roupa cheia de brilho! Exu de verdade, pra mim, tem que cantar, dançar, chegar na frente de um atabaque e dar um verdadeiro show e não ficar parado feito uma estátua como o senhor!
-É meu filho, eu não sou assim. Eu prefiro ajudar as pessoas, dando um bom conselho e, principalmente, ajudando a proteger meus filhos contra os perigos da vida e em suas lutas diárias para superar seus problemas e suas dificuldades.
Rindo, com ar de deboche, se afastando, Ribamar, disse:
-Tá bom, meu velho, o senhor fala muito bonito, mas se fosse bom de verdade ajudava seu filho a lhe dar uma roupa melhor.
Eu é que não quero a proteção de um Exu assim! Eu quero a proteção de um Exu que me dá dinheiro!
Antes de a festa terminar, já que Laurinda e Jovelina tinham que acordar cedo para trabalhar no dia seguinte, Ribamar foi embora.
Quando estava pegando o carro estacionado na rua detrás do terreiro, dois homens numa moto renderam os três dizendo que era um assalto, pedindo as bolsas das mulheres e o celular de Ribamar. Apavoradas, as mulheres saíram correndo de volta para o terreiro, seguidas por Ribamar. Os ladrões, então, vendo a reação deles, resolveram atirar, antes de saírem em disparada com a moto.
Foram quatro tiros em direção a Ribamar e um deles atingiu de raspão o seu braço esquerdo.
Ao chegarem no terreiro, as mulheres e Ribamar estavam muito nervosos e abalados. Com o braço ensanguentado e ainda tremendo muito, Ribamar viu seguir em sua direção aquele Exu que ele tanto zombara minutos antes. Foi quando o Exu calmamente disse:
- Meu filho, você está bem, né! Ainda bem que eu estava lá para lhe proteger. Aqueles dois marginais podiam ter lhe matado. Estou feliz de ter cumprido a minha missão mais uma vez, protegendo meus filhos e os livrando do mal!
Sem conter as lágrimas, Ribamar abraçou aquele Exu como nunca havia feito e chorou como nunca chorara em toda a sua vida.
Ainda muito emocionado, só teve condições de falar três palavras:
- Me perdoa!
E Exú respondeu:
-Perdoar de quê, meu filho? Eu fiz a minha parte, como sempre faço. Eu estou aqui para lhe dar proteção! Fica em paz!
Laroyê Exu
