Casa das Minas
Casa das Minas | |
---|---|
Tipo | templo |
Geografia | |
Coordenadas | |
Localização | São Luís |
País | Brasil |
A Casa das Minas é um templo de tambor de mina localizado na Rua de São Pantaleão, no chamado Centro Histórico da cidade São Luís, capital do estado do Maranhão, no Brasil
Estrutura[editar | editar código-fonte]
Fica localizada em um terreno que possui cerca de 1500 m², sendo que 660 m² de área construída. A casa é formada por dois casarões cercados por um muro, com duas portas e seis janelas voltadas para a Rua de São Pantaleão. Possui inúmeras salas, distribuídas ao longo de uma varanda e um corredor que dá acesso ao terreiro. No interior da casa, se encontra o comé, área sagrada, que está sempre fechada e, para acessá-la, há exigências a respeitar-se. No comé, se encontra o péji, santuário ou altar dos voduns da Casa.[2]
Histórico[editar | editar código-fonte]
Fundada em meados do Século XIX, por uma mulher africana chamada Maria Jesuína, que veio ao Brasil como escrava e que, segundo Pierre Verger era na verdade a Rainha Nã Agontimé, Esposa do Rei Agonglô do Daomé e mãe do Rei Guezô. No documento mais antigo de que se tem notícia sobre a Casa das Minas, a escritura do prédio da esquina data de 1847, estando em nome de Maria Jesuína e suas companheiras, que, segundo relatos, eram africanas.[3]
A Casa das Minas (ou Querebentã de Zomadonu) possui uma tradição matriarcal, ou seja, só é governada por mulheres e somente mulheres podem serem possuídas pelos voduns (os homens só podem participar do culto tocando os instrumentos musicais litúrgicos). O templo tem o nome africano de Querebentã de Zomadônu, porque Querebentã significa casa em língua jeje e Zomadônu, pois foi a esse Vodum que a casa é consagrada, já que ele era o Vodum da fundadora, Maria Jesuína e de Mãe Luísa, a sucessora de Maria Jesuína na liderança do templo e que o chefiou até pelo menos o início da década de 1900, sendo sucedida por Mãe Hosana, que governou a casa até 1915. A mais famosa sacerdotisa a governar o templo, foi Mãe Andressa Maria, sucessora de Mãe Hosana, considerada a última princesa de linhagem direta Fon a governar a casa. Ela nasceu em 1854 e morreu em 1954 aos 100 anos de idade. [4]
Após ela, chefiaram a casa Mãe Anéris Santos (até 1961), Dona Manoca (até 1967) Dona Leocádia (até 1970), Mãe Filomena (até 1972; última vodunsi-gonjaí), Dona Amância (até 1976; primeira vodunsi-he a assumir a Casa), Dona Amélia (até 1997) e Dona Deni (até 2015).[4]
Não possui casas que lhe sejam filiadas, daí porque nenhuma outra siga completamente seu estilo. Nesta casa os cânticos são em língua jeje (Mina-Ewê-Fon) e só se recebem divindades denominadas de voduns. Apesar de não ter casas filiadas, o modelo do culto do Tambor-de-Mina é grandemente influenciado pela Casa das Minas, sendo um símbolo do tambor de mina tradicional.
Encontra-se tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), pelo processo nº 1464-T-00, de 2002, tendo sido objeto de muitos estudos acadêmicos no Brasil e no exterior. Durante a gestão de Dona Amélia, pesquisadores articularam contato da Casa com templos africanos do Benin, tendo a vondunsi dona Celeste visitado o país em 1993, e Dona Deni trocado correspondências com o chefe de culto de Zomadonu em Abomey. [4]
Culto[editar | editar código-fonte]
Os voduns da Casa das Minas, de quem se conhecem os nomes de aproximadamente sessenta, agrupam-se em três famílias principais e duas que são hóspedes da casa, a saber: a família de Davice, também chamada de família real, a que pertence o vodum dono da casa, Tói Zomadônu e outros, que como ele são relacionados com a família real do Daomé, como: Tói Dadarrô, Tói Doçú-Bogueçagajá, Tói Bedigá, Nochê Sepazin, Tói Daco-Donu, Tói Nagono Toçá, Tói Nagono Tocé e Tói Jagoroboçú; a família de Quevioçô (dos voduns chamados nagôs), como Tói Badé Nenem Quevioçô (Xangô), Nochê Sobô Babadi (Iansã), Tói Lôco (Iroko), Tói Lissá (Oxalá), Tói Averequête, Nochê Abê (Iemanjá) e outros; a família de Dambirá (que cura a peste e outras doenças), chefiada por Tói Acóssi Sapatá Odan e que incluí entre outros Tói Azíle, Tói Agonçozonce Dambirá, Tói Polibojí, Tói Lepon, Tói Alôgüé, Nochê Yewá, Nochê Bôçalabê e Tói Boçucó.
O vodun feminino Nochê Naê é a chefa das Tobôssis. Nochê Naê é considerada a mãe de todos os voduns, sendo chamada também de ‘senhora velha’ ou sinhá velha. As suas vestimentas eram com saias coloridas, pulseiras de búzios e coral, chamadas dalsas, pano da costa colorido e manta de miçangas coloridas presa ao pescoço e usavam vários rosários.[5][6]
Existem ainda os voduns Tói Ajaúto de Aladánu e Tói Avrejó que formam a família de Aladanu, hóspede de Quevioçô, e os voduns agrupados na família de Savaluno, hóspede de Davice, como Tói Agongono e Tói Jotin. Cada família ocupa uma parte específica da casa e tem cânticos, comportamentos e atividades próprias. O título de Tói significa que o vodum é masculino e o título de Nochê significa que o vodum é feminino
Na Casa das Minas as vodúnsis só são possuídas pelos voduns e cada uma só pode ser possuída por um vodum específico. As vodúnsis da Casa das Minas não podem dançar antes de entrarem em transe. Durante o transe as vodúnsis ficam com os olhos abertos, não comem, não bebem e não satisfazem necessidades fisiológicas. Os voduns, manifestados nas vodúnsis, podem falar e manter diálogos, (a exceção dos Voduns da Família de Quevioço que são mudos e se comunicam por sinais que são interpretados por Tói Averequête e Nochê Abê, os únicos que falam). Eles costumam a conversar entre si e com os devotos, dando-lhes conselhos e recados. Os voduns também entoam os seus próprios cânticos e dançam. Há alguns que gostam de fumar um cachimbo.
Na Casa Grande das Minas Jeje os toques são realizados por três tambores com couro numa só boca (hum, humpli e gumpli), batidos com a mão e com aguidavi. São também acompanhados pelo ferro (gã) e por cabaças pequenas revestidas de contas coloridas. Nas festas as vodúnsis usam saias lisas na mesma cor ou estampada, blusa branca rendada, pequenas sandálias de salto baixo que devem ser um pouco menores que os pés da vodúnsi e um colar de guias de miçangas pequenas coloridas em que predominam o marrom (gonjeva), chamado de Rosário, onde se coloca medalhas, objetos de sorte, conchas marinhas e um crucifixo. Antes de entrarem em transe, as vodúnsis se perfumam. Ao entrarem em transe passam a usar uma toalha branca bordada de rendas amarrada nos seios ou na cintura e a carregar um lenço branco na mão. Algumas usam símbolo do seu vodum, como bengala, espada, leques, jóias, um lenço colorido no ombro esquerdo e penteados especiais.
Rituais[editar | editar código-fonte]
Alguns dos principais rituais que eram realizados na Casa das Minas: a "Festa de Averequete" (vodum que é "devoto" de São Benedito), o "Banquete dos Cachorros" (homenagem a São Lázaro, na qual um jantar é oferecido para os cachorros e as crianças), o "Arrambam" (festa de encerramento das atividades do terreiro devido ao período da quaresma), a "Festa do Divino", (geralmente uma cerimônia do catolicismo popular, mas que no tambor de mina é feito no interior dos terreiros), o "Tambor de Pagamento" (festa para pagamento dos tocadores) e o "Tambor de Choro" (ritual fúnebre).[7]
Atualidade[editar | editar código-fonte]
Atualmente, o culto em sua plenitude da Casa das Minas se encontra extinto após o falecimento da vodúnsi Dona Deni, em 8 de fevereiro de 2015, aos 89 anos, a nona líder do templo, pois não há mais vodúnsis disponíveis para serem possuídas pelos voduns.
Desde 1914, não foram realizados rituais de iniciação completa e as últimas vodunsis-gonjaí que se submeteram a estes rituais morreram em inícios da década de 1970. Além de um vodum, recebiam uma entidade feminina infantil denominada tobossi. Os motivos de deixarem de realizar iniciações de novos membros não são claros, em razão da comunidade religiosa ser profundamente discreta e rigorosa. O quadro reduzido de participantes, a perda de rituais importantes, a preservação dos segredos (sem serem repassados), o interesse pela umbanda e o candomblé (e sua influência em outras casas de tambor de mina), o crescimento de religiões pentecostais e a perseguição a terreiros contribuíram para seu declínio.[8]
Tendo criado um profundo e histórico laço de solidariedade e amizade com a Casa de Nagô (que ajudou a fundar), a uma quadra de distância, há uma crença de que uma deverá apoiar a outra.[4]
Atualmente, a Casa é dirigida por Euzébio Pinto, neto de Dona Amélia, tocador chefe (huntó) do terreiro, que continua dando seguimento, não aos trabalhos religiosos do culto, mas às festividades tradicionais do templo, integrantes da cultura maranhense, e que eram solicitados pelos voduns que gostavam delas. [9]
A Casa das Minas continua realizando suas obrigações e vem estabelecendo estratégias para a continuação de suas atividades, a exemplo da promoção de festas do catolicismo e da cultura popular, como as festas do Divino Espírito Santo, a Queimação das Palhinhas do presépio com ladainha e mesa de doces no Dia de Reis, Quarta-Feira de Cinzas, Sábado de Aleluia, dia de São Benedito, Dia de São Cosme e São Damião e o Dia de Santa Bárbara. Em algumas destas festas, ocorrem apresentações de grupos de Tambor de Crioula ou de Bumba-meu-boi, sendo um importante polo cultural. Também se considera um exemplo de resistência e memória da cultura e religiosidade negras, visto que outras casas da mesma época não existem mais.[10][8]