segunda-feira, 2 de maio de 2022

OS ANIMAIS EM OUTROS PLANETAS

 

OS ANIMAIS EM OUTROS PLANETAS

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Em Júpiter, como em toda parte, os que alçam vôos mais altos são os mais raros; abaixo deles, é preciso contar várias camadas de Espíritos inferiores, tanto em virtude quanto em poder,mas naturalmente livres para os igualarem um dia, quando se aperfeiçoarem. Escalonados e classificados conforme os seus méritos,estes se dedicam mais particularmente aos trabalhos que interessam ao próprio planeta, não exercendo, sobre os mundos inferiores, a autoridade toda poderosa dos primeiros. É verdade que respondem a uma evocação, através de revelações sábias e boas, mas, pela presteza que demonstram em nos deixar e pelo laconismo de suas palavras, é fácil compreender que têm muito o que fazer em outra parte, e que não se encontram ainda suficientemente desprendidos para se fazerem irradiar simultaneamente em dois pontos tão distantes um do outro. Enfim, seguindo os menos perfeitos desses Espíritos, mas deles separados por um abismo, vêm os animais que,como únicos serviçais e únicos trabalhadores do planeta, merecem uma menção toda especial.
Se designamos pelo nome de animais os seres bizarros que ocupam a base da escala, é porque os próprios Espíritos o utilizaram e também em razão de nossa língua não dispor de melhor termo para nos oferecer. Essa designação os avilta bastante; chamá-los, porém, de homens seria conceder-lhes muita honra; de fato,são Espíritos votados à animalidade, talvez por muito tempo ou, quem sabe, para sempre. Contudo, nem todos os Espíritos são concordes com esse ponto e a solução do problema parece pertencer a mundos mais elevados que Júpiter; seja qual for o seu futuro,entretanto, não há equívocos sobre o seu passado. Antes de ir para lá, esses Espíritos emigraram sucessivamente em nossos mundos inferiores, do corpo de um ao de outro animal, através de uma escala de aperfeiçoamento perfeitamente graduada. O estudo atento de nossos animais terrestres, seus costumes, suas características individuais, sua ferocidade longe do homem e sua domesticação lenta, mas sempre possível, tudo indica suficientemente a realidade dessa ascensão animal.
Desse modo, para qualquer lado que nos voltemos, a harmonia do Universo se resume sempre em uma única lei: o progresso, por toda parte e para todos, para o animal como para a planta, para planta como para o mineral; progresso puramente material, a princípio, nas moléculas insensíveis do metal ou do calhau, para tornar-se cada vez mais inteligente à medida que ascendemos à escala dos seres e que a individualidade tende a desembaraçar-se da massa, a afirmar-se, a conhecer-se. Pensamento elevado e consolador, jamais imaginado antes,porquanto nos prova que nada é sacrificado, que a recompensa é sempre proporcional ao progresso realizado; o devotamento do cão, por exemplo, que morre pelo dono, não é estéril para o seu Espírito, cujo salário justo haverá de receber além deste mundo.É o caso dos Espíritos animais que povoam Júpiter; eles se aperfeiçoaram ao mesmo tempo que nós, conosco e com o nosso auxílio. A lei é mais admirável ainda: faz tão bem de seu devotamento ao homem a primeira condição de sua ascensão planetária, que a vontade de um Espírito de Júpiter pode chamar a si todo animal que, numa de suas vidas anteriores, lhe haja dado provas de afeição. Essas simpatias, que lá no alto formam famílias de Espíritos, também agrupam em torno das famílias todo um cortejo de animais devotados. Em consequência, nosso apego neste mundo por um animal, o cuidado que tomamos de domesticá-lo e de humanizá-lo, tudo isso tem sua razão de ser, tudo será pago: é um bom ajudante que preparamos antecipadamente para um mundo melhor.
Será assim um operário, porquanto aos seus semelhantes está reservado todo trabalho material, toda tarefa corporal: carga ou obras pesadas, semeadura ou colheita. E para tudo isso a Suprema Inteligência preparou um corpo que participa ao mesmo tempo das vantagens do animal e do homem. Podemos fazer uma avaliação pelo esboço de Palissy, representando alguns desses animais muito aplicados em jogar bola. Eu não os poderia melhor comparar senão aos faunos e aos sátiros da Fábula; o corpo, levemente peludo é, entretanto, aprumado como o nosso; entre alguns as patas desapareceram, dando lugar a certas pernas que ainda lembram a forma primitiva, os dois braços robustos, singularmente implantados e terminados por verdadeiras mãos, se levarmos em conta a oposição dos polegares. Coisa bizarra: a cabeça não é tão aperfeiçoada quanto o resto! Dessa forma, a fisionomia reflete bem alguma coisa de humano, mas o crânio, o maxilar e, sobretudo, a orelha não apresentam diferenças sensíveis em relação aos animais terrestres. É, pois, fácil distingui-los entre si: este é um cão, aquele é um leão. Convenientemente vestidos com blusas e vestes muito semelhantes às nossas, eles só faltam falar para lembrar de bem perto certos homens daqui; eis precisamente o que lhes falta e que não poderiam fazer. Hábeis para se entenderem entre si, por meio de uma linguagem que nada tem da nossa, não mais se enganam sobre as intenções dos Espíritos que os comandam: basta um olhar, um gesto. A certos abalos magnéticos, dos quais nossos domadores de bestas já conhecem o segredo, o animal advinha e obedece sem murmurar e, melhor ainda, com boa vontade, porque está fascinado. É desse modo que lhe é imposta toda a tarefa pesada e que, com seu auxílio, tudo funciona regularmente de um extremo ao outro da escala social: o Espírito elevado pensa e delibera, o espírito inferior age com sua própria iniciativa e o animal executa. Assim, a concepção, a execução e o fato se unem numa mesma harmonia, levando todas as coisas a uma solução mais rápida, pelos meios mais simples e mais seguros.
Victorien Sardou.
Allan Kardec
R.E. , agosto de 1858, p. 347