Existe um orixá muito potente, mas pouco conhecido. O orixá Tempo.
Ele é representado pela árvore Irôko e reclama nos terreiros que as pessoas só o invocam quando estão muito aperreadas, “com piolho na cabeça”, querendo logo resolver algo.
E o que ele pede é justamente atenção, que se dê a ele o ritmo acertado de cada coisa, a seu passo, com sua cadência própria.O tempo, aquele que segue ligeiro, à galope, às vezes trôpego, ditando nossa toada.
O tempo. Aquilo que pára e finca raízes bem quando sorvemos algo que vem daquele lugar distinto e que se liga sem pudores à ordem dos prazeres.
O tempo que esperneia e urge, dando rasteira pra todo lado, num balé capoeirístico, quando nosso pescoço é atucanado pelos afazeres.
O tempo indolente, que se arrasta moroso e pesado quando não estamos em sintonia com o que sucede em nossas vidas.
O tempo lânguido e certeiro pra escolher as sementes, avaliar a qualidade da terra que se tem pra poder semear e, assim, esperar vingar.
O tempo vívido e fecundo pra adubar, tirar as ervas daninhas que crescem sedentas em volta da planta, deixar o sol entrar e esperar o milagre acontecer.
O tempo maroto pra olhar pro lado e ver que certas coisas já perderam a validade, oxidaram. Enferrujaram num canto qualquer da nossa história.
O tempo sagaz de acolher o novo, desfazer-se do que já não tem serventia ou valia. E o tempo precioso de saber discernir entre um e outro.
O tempo laborioso e o tempo de Dionísio. Ambos, frente a frente, numa eterna batalha pra ver quem é mais ágil em abocanhar o outro.
Ah, o tempo fugido que escorre como areia das mãos a cada virada de ano, a cada aniversário celebrado, a cada mirada em nossos filhos, vendo-os reconfigurado e renascidos com o passar desse orixá.
Não tem essa de invocar Exús Mensageiros sem pedir licença ao tempo.
Toda a questão da pós-modernidade está aí, dissecada por esse Orixá. Que se dê, então, tempo ao tempo.