"Exu é mensageiro, verdadeiro guardião, tem um velho que protege na entrada do portão, pra alguns ele é Caveira e pra outros é João."
- O derradeiro
"Exu é mensageiro, verdadeiro guardião, tem um velho que protege na entrada do portão, pra alguns ele é Caveira e pra outros é João."
- Suncê veio prosear velho amigo João? Quando vem até aqui é porquê a coisa tá feia.
- Salve Pai Antônio. E a coisa tá mesmo feia, o senhor não se enganou. O povo da terra insiste em apagar as luzes que acendemos e depois reclamam da escuridão.
- Mas foi sempre assim velho João Caveira e dificilmente vai mudar. O povo muda a tempada, vira as luas, mas num muda o jeito de caminhar. Acham que sabem de tudo e que sabem onde tão pisando.
- E o que podemos fazer agora por eles, quando se desesperam?
- Por eles? Ou por ele?
- Sábio Pai Antônio. Sempre sabe das coisas né?
- Não tem nada que passe no portão que suncê não saiba, mas não tem nada que se aconteça com nosso menino que eu não fique sabendo. São os impulsos, a raiva. Ele se perde aí.
- Tentei interferir, mas a cabeça dele tá um turbilhão Pai Antônio. Muita coisa na cabeça não sobra tempo pra achar as coisas no coração.
- Chama-se mágoa João. Se nada é feito do jeito dele, passam por cima dele, ele que não aprendeu a seguir regras se perde e se perde feio. É luz pros outros, mas pode ser escuridão se não cuidar. Tanto busca a paz esse povo, tanto buscam calma, tanta guerra encontram.
- Vim pedir ao senhor pra vir comigo. Ela também irá junto. Vamos tentar com que ele fique calmo e tenha decisões firmes. O que está por vir é duro, e ele precisará de toda a ajuda. O fardo é pesado.
- Como recusar ajudar um filho meu? Vamos agora mesmo. Acende um toco, faz um defumador e bota o moço da espada na proteção. É assim que ele se sustentará. Melhor que firmador é cabeça firme. Sem cabeça o povo não caminha.
- Maria está pronta e também está levando algumas coisas. Será um longo e difícil trabalho. E sem o senhor e sua sabedoria, a calma que traz pra ele, tudo fica ainda mais difícil. Ele sente o cheiro do palheiro e já se acalma.
- Poderia ser sempre assim se reparasse mais na espiritualidade e menos nos outros. Ele quer apressar o tempo de cada um. Acelera ele e os outros ficam é sem entender nada.
- Cada um tem um tempo. E ele sabe disso. Só não consegue parar com tanta coisa acontecendo. Como viver as coisas novas, se todo dia tem uma coisa nova? Sei que ele tem fé e um coração que não cabe no peito. Mas assim como o coração tem amor e fé, tem revolta e ferida.
- E quem cutuca ferida, faz sangrar né velho amigo? E quando sangra, é difícil controlar. Machuca. E filho machucado revida quando devia calar. A boca é maior que a vontade.
- Não quero interromper a conversa, mas já está na hora de irmos.
- Sim Maria. Podemos ir Pai Antônio?
- Deixa eu pegar meu toco e vamos alumiar de novo. Não tem vento que apague quando a proteção é forte.
" Era um cemitério, tério, tério, tério... "
Escrito por Rascunhos do Fabio de Souza.