domingo, 3 de abril de 2022

OS MOMENTOS FINAIS DO MESTRE (Extraído do livro O Sublime Peregrino pelo Espírito Ramatís psicografado pelo médium Hercilio Maes)

 OS MOMENTOS FINAIS DO MESTRE
(Extraído do livro O Sublime Peregrino pelo Espírito Ramatís psicografado pelo médium Hercilio Maes)


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(Extraído do livro O Sublime Peregrino pelo Espírito Ramatís psicografado pelo médium Hercilio Maes)


"O cimo do Gólgota estava ficando deserto de estranhos e curiosos, pois só os amigos, discípulos e parentes ali permaneciam açoitados pelo vento cada vez mais impetuoso e uivante à flor do solo.

A dor do Cordeiro do Senhor extravasava o cálice da suportação humana; o Espírito mergulhado na tortura da carne vivia minutos eternos represando em si as angústias da imensa responsabilidade de esgotar a última gota de fel para a redenção do gênero humano.

A chuva benfeitora rugia além das colinas da Galiléia, manchando o noroeste de um negro líquido; mas Jesus não desejava, de modo algum, esse alívio, que, ao mitigar-lhe a sede abrasadora e banhar-lhe o corpo febril, também lhe prolongaria o sofrimento desumano.

Sentia uma excitação psico-nervosa cada vez mais intensa, tentando reunir todas as suas forças físicas e espirituais para vencer a terrível opressão que ameaçava despedaçar-lhe os tímpanos, romper-lhe a garganta e a cavidade pulmonar.

Quis abrir os olhos e só o conseguiu após tremendo esforço, movendo tormentosamente a cabeça numa leve inclinação para a frente, como se tentasse vencer a massa granítica que parecia lhe pesar na fronte.

Eis que naquele momento, então, fulgura no céu tenebroso um relâmpago imensurável; sob a sua luz cegante, Jesus pôde vislumbrar e reconhecer os seus amigos, alguns discípulos e as piedosas mulheres que ali se reuniam na mais terna e veemente oração.

Sua alma entreabriu-se numa visão beatífica e ele tentou mover os lábios; mas estavam tão rígidos, que não puderam, sequer, esboçar-lhe o sorriso meigo de gratidão aos seus queridos.

O trovão rebentou forte e as nuvens dançavam furiosamente em choques bruscos; o peso da atmosfera parecia cair todo sobre o corpo de Jesus aumentando-lhe a terrível sensação de cruel esmagamento.

Súbito, uma dor atroz partiu-lhe das pontas dos dedos da mão esquerda; depois subiu-lhe rápida pelo braço, como um arame incandescente perfurando-lhe as veias; e, num átimo de segundo, bloqueou-lhe o coração, paralisando-lhe a respiração.

Um forte estremecimento sacudiu-lhe as faces, os lábios e as pontas dos dedos entorpecidos; os olhos se nublaram completamente e sua cabeça pendeu desamparada sobre o ombro esquerdo...

O Messias havia expirado!
Eram três horas da tarde.

Tiago viu-lhe a morte à luz do relâmpago e caiu de joelhos num grito de dor pela perda do Mestre, e num brado de júbilo pela sua libertação do suplício bárbaro da cruz.

Todos levantaram-se e numa só exclamação, de braços erguidos, gritavam jubilosamente chamando a atenção dos soldados:

- Hosanas! Hosanas!
- O Mestre expirou!
- O Senhor nos ouviu!

Prostravam-se ao solo e beijavam a terra entre soluços indescritíveis.

Então o chefe da patrulha de soldados, empunhando a lança, feriu a carne de Jesus; primeiramente de leve, e depois forçou-a até manchar-se de rubro e verificar que não havia mais sinal de vida.

Em seguida, ordenou a um soldado que fosse dar ciência ao centurião Quinto Cornélio da morte de um dos crucificados.

Findara-se, entre todos, o angustioso temor de o Amado Mestre apodrecer vivo na cruz ou ser devorado pelas aves de rapina.

Graças à sua natureza delicada e ao enfraquecimento vital produzido pela exsudação sanguínea no Horto das Oliveiras, ele sucumbira em menos de três horas pelo rompimento benfazejo da aorta dando-lhe a desejada libertação na cruz.

Alguns minutos depois o céu então se abria em cataratas de chuva torrencial, sob o fragor dos trovões assustadores, do vento furioso e dos raios fulgurantes, desgalhando árvores, abrindo sulcos na terra ressequida, desmontando telheiros, ruindo túmulos à flor do solo, arrasando granjas e manjedouras, rompendo diques, extravasando rios, estraçalhando pontes, derribando muros, desmontando ruínas e abarrotando o chão das herdades com milhares de frutos maduros.

As cruzes oscilavam ameaçando tombar devido ao amolecimento da reduzida massa de terra que cobria o cimo rochoso do monte da caveira, onde se dera a crucificação.

Os soldados calçavam-nas com pedras e paus no meio da água que se juntava nas bases vacilantes.

Os dois ladrões crucificados moviam-se reanimados pela preciosa linfa que lhes escorria através dos cabelos empapados, na avidez animal de sobreviverem.

Malgrado a insistência dos soldados para que todos abandonassem o local, pois ali nada mais tinham a fazer com a morte de Jesus, os seus amigos e discípulos permaneceram encharcados até os ossos e enlameados até os tornozelos.

Maria, abraçada à trave inferior da cruz, beijava o dorso dos pés do amado filho; Madalena soluçava prostrada de bruços no solo lamacento; e Tiago, de braços cruzados, não desfitava os olhos do semblante imóvel e pálido do seu adorado Amigo, sentindo-se venturoso de vê-lo livre daquele suplício infernal.

Pedro revelava um espanto tão doloroso na sua face, que ainda parecia duvidar daquele acontecimento tão trágico.

João, de olhos entre-cerrados, tinha a mão direita crispada sobre o coração e a esquerda pousada na testa inclinada; temia despertar do seu inundo fantasioso e defrontar o pesadelo mais atroz da sua vida.

Os demais enchiam o ar de lamentos e prantos tão próprios da raça hebréia, erguendo os braços aos céus, em tormentosa súplica e cruciante desespero.

Finalmente, ao anoitecer, José de Arimatéia e Nicodemus haviam conseguido de Pilatos a autorização para descer-lhe o corpo da cruz, o qual estranhou a morte tão rápida de Jesus.

Depois de embalsamado com aromas, sais da tradição hebraica e envolto em lençóis limpos, o corpo do Amado Mestre foi colocado num sepulcro novo, cavado na rocha viva de um horto adjacente, até lhe ser destinada mais tarde a moradia adequada, pois sendo o sábado o "dia da preparação" da Páscoa dos judeus, não se deveria cuidar de cerimônias fúnebres.

A tempestade havia amainado e a água da chuva escorria pelas fendas rochosas e enlameadas do Gólgota.

Momentos depois, o grupo de criaturas pesarosas se punha a caminho entoando um canto triste e pungente, o mais profundo lamento da alma atormentada, onde a saudade, o remorso, a angústia e o desalento lavravam como o fogo queimando as carnes tenras.

Era a procissão lamentosa de homens e mulheres lavados pela chuva e manchados pela lama, que seguiam pranteando a perda do Sublime Amigo Jesus, o homem justo, inocente, heróico e leal, que sucumbira para deixá-los viver.

Quando desapareceram no sopé da colina rochosa em direção à cidade, deixando nas asas do vento fatigado os sons melancólicos dos mais acerbos queixumes, ainda se podia ver no cimo do Gólgota a silhueta das três cruzes, que Jesus havia entrevisto mediunicamente, durante a sua agonia espiritual no Horto das Oliveiras e na véspera de sua morte.

No entanto, a cruz do centro estava vazia, porque já se havia cumprido o sacrifício do Salvador.

Daquele momento em diante, ela deixava de ser o instrumento de castigo infamante do homem, para se tornar o caminho abençoado da libertação espiritual da humanidade.

Jesus, o Messias, havia triunfado sobre as Trevas, nutrindo a Luz do mundo através do combustível sacrificial do seu próprio sangue."